VEJA Edição 1998 7 de março de 2007
"Os pobres com pouco estudo devemcompetir pelos empregos que o mercadooferece. Mas para quem tem curso universitárioo mercado é protegido por lei"
Faz quase dois séculos que foram fundadas escolas de direito e medicina no Brasil. É embaraçoso verificar que ainda não foram resolvidos os enguiços entre diplomas e carreiras. Falta-nos descobrir que a concorrência (sob um bom marco regulatório) promove o interesse da sociedade e que o monopólio só é bom para quem o detém. Não fora essa ignorância, como explicar a avalanche de leis que protegem monopólios espúrios para o exercício profissional?
Desde a criação dos primeiros cursos de direito, os graduados apenas ocasionalmente exercem a profissão. Em sua maioria, sempre ocuparam postos de destaque na política e no mundo dos negócios. Nos dias de hoje, nem 20% advogam.
Mas continua havendo boas razões para estudar direito, pois esse é um curso no qual se exercita lógica rigorosa, se lê e se escreve bastante. Torna os graduados mais cultos e socialmente mais produtivos do que se não houvessem feito o curso. Se aprendem pouco, paciência, a culpa é mais da fragilidade do ensino básico do que das faculdades. Diante dessa polivalência do curso de direito, os exames da OAB são uma solução brilhante. Aqueles que defenderão clientes nos tribunais devem demonstrar nessa prova um mínimo de conhecimento. Mas, como os cursos são também úteis para quem não fez o exame da Ordem ou não foi bem-sucedido na prova, abrir e fechar cursos de "formação geral" é assunto do MEC, não da OAB. A interferência das corporações não passa de uma prática monopolista e ilegal em outros ramos da economia. Questionamos também se uma corporação profissional deve ter carta-branca para determinar a dificuldade das provas, pois essa é também uma forma de limitar a concorrência – mas trata-se aí de uma questão secundária.
A medicina é uma carreira estritamente profissional, não prepara para outras funções. O custo de estudá-la é quatro vezes maior do que o custo de estudar direito. E pior do que no direito são as conseqüências dramáticas dos erros. Portanto, garantir qualidade na formação de todos os médicos é do mais legítimo interesse social. É lamentável que as associações médicas demonstrem uma atitude tão tíbia diante de faculdades fracas. Pior, a lista de punições para erros médicos é embaraçosamente curta.
A melhor solução está aí para todos verem: as provas da OAB, os exames para exercer medicina nos Estados Unidos e, agora, iniciativas semelhantes em São Paulo. Ademais, os médicos, como os pilotos de avião, deveriam passar em provas periódicas, para demonstrar sua atualização. Querer proibir a abertura de cursos não passa de uma tentativa de reduzir a oferta de médicos, sem melhorar a qualidade dos que aí estão. Ao desdenharem dos exames e reivindicarem um ferrolho nas faculdades, as associações mostram à sociedade que prezam mais seus salários do que a saúde da população. O correto seria a liberdade de abrir cursos, seguida de uma prova individual rígida. Como acontece em outros países, só quem varasse esse ferrolho poderia exercer a medicina.
Resta mencionar os cursos de administração, outra formação clássica de cultura geral. Por que exigir diplomas para o exercício profissional? Nos Estados Unidos, onde nasceram tais cursos, não há nenhuma exigência de diploma. Além disso, as melhores universidades não oferecem administração no nível de bacharelado. Na Alemanha, praticamente, não há formação em administração de empresas. Não consta que esses países padeçam de incompetência crônica na gestão dos seus negócios. É mais uma profissão se locupletando dos monopólios conferidos por leis passadas sorrateiramente no Congresso. Jornalismo é um caso até mais absurdo de monopólio dos diplomas. Menos mal que uma lei semelhante para bacharéis de astrologia não foi aprovada.
É no mínimo um passo atrás que o MEC haja cedido às pressões dos médicos e advogados para exercer legalmente o seu pseudodireito de vetar a abertura de novos cursos। Erro do MEC? Não, da sociedade brasileira, que assiste passivamente a tais tentativas de cercear a concorrência. Os pobres com pouco estudo devem competir pelos empregos que o mercado oferece. Mas para quem tem curso universitário o mercado é protegido por lei.
"Os pobres com pouco estudo devemcompetir pelos empregos que o mercadooferece. Mas para quem tem curso universitárioo mercado é protegido por lei"
Faz quase dois séculos que foram fundadas escolas de direito e medicina no Brasil. É embaraçoso verificar que ainda não foram resolvidos os enguiços entre diplomas e carreiras. Falta-nos descobrir que a concorrência (sob um bom marco regulatório) promove o interesse da sociedade e que o monopólio só é bom para quem o detém. Não fora essa ignorância, como explicar a avalanche de leis que protegem monopólios espúrios para o exercício profissional?
Desde a criação dos primeiros cursos de direito, os graduados apenas ocasionalmente exercem a profissão. Em sua maioria, sempre ocuparam postos de destaque na política e no mundo dos negócios. Nos dias de hoje, nem 20% advogam.
Mas continua havendo boas razões para estudar direito, pois esse é um curso no qual se exercita lógica rigorosa, se lê e se escreve bastante. Torna os graduados mais cultos e socialmente mais produtivos do que se não houvessem feito o curso. Se aprendem pouco, paciência, a culpa é mais da fragilidade do ensino básico do que das faculdades. Diante dessa polivalência do curso de direito, os exames da OAB são uma solução brilhante. Aqueles que defenderão clientes nos tribunais devem demonstrar nessa prova um mínimo de conhecimento. Mas, como os cursos são também úteis para quem não fez o exame da Ordem ou não foi bem-sucedido na prova, abrir e fechar cursos de "formação geral" é assunto do MEC, não da OAB. A interferência das corporações não passa de uma prática monopolista e ilegal em outros ramos da economia. Questionamos também se uma corporação profissional deve ter carta-branca para determinar a dificuldade das provas, pois essa é também uma forma de limitar a concorrência – mas trata-se aí de uma questão secundária.
A medicina é uma carreira estritamente profissional, não prepara para outras funções. O custo de estudá-la é quatro vezes maior do que o custo de estudar direito. E pior do que no direito são as conseqüências dramáticas dos erros. Portanto, garantir qualidade na formação de todos os médicos é do mais legítimo interesse social. É lamentável que as associações médicas demonstrem uma atitude tão tíbia diante de faculdades fracas. Pior, a lista de punições para erros médicos é embaraçosamente curta.
A melhor solução está aí para todos verem: as provas da OAB, os exames para exercer medicina nos Estados Unidos e, agora, iniciativas semelhantes em São Paulo. Ademais, os médicos, como os pilotos de avião, deveriam passar em provas periódicas, para demonstrar sua atualização. Querer proibir a abertura de cursos não passa de uma tentativa de reduzir a oferta de médicos, sem melhorar a qualidade dos que aí estão. Ao desdenharem dos exames e reivindicarem um ferrolho nas faculdades, as associações mostram à sociedade que prezam mais seus salários do que a saúde da população. O correto seria a liberdade de abrir cursos, seguida de uma prova individual rígida. Como acontece em outros países, só quem varasse esse ferrolho poderia exercer a medicina.
Resta mencionar os cursos de administração, outra formação clássica de cultura geral. Por que exigir diplomas para o exercício profissional? Nos Estados Unidos, onde nasceram tais cursos, não há nenhuma exigência de diploma. Além disso, as melhores universidades não oferecem administração no nível de bacharelado. Na Alemanha, praticamente, não há formação em administração de empresas. Não consta que esses países padeçam de incompetência crônica na gestão dos seus negócios. É mais uma profissão se locupletando dos monopólios conferidos por leis passadas sorrateiramente no Congresso. Jornalismo é um caso até mais absurdo de monopólio dos diplomas. Menos mal que uma lei semelhante para bacharéis de astrologia não foi aprovada.
É no mínimo um passo atrás que o MEC haja cedido às pressões dos médicos e advogados para exercer legalmente o seu pseudodireito de vetar a abertura de novos cursos। Erro do MEC? Não, da sociedade brasileira, que assiste passivamente a tais tentativas de cercear a concorrência. Os pobres com pouco estudo devem competir pelos empregos que o mercado oferece. Mas para quem tem curso universitário o mercado é protegido por lei.
CLÁUDIO MOURA CASTRO
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